CASO CLÍNICO:
Masculino, 27 anos, com fraqueza progressiva iniciada em membro inferior há 4 anos, que evoluiu lentamente, com incapacidade para o trabalho e dificuldade para as atividade de vida diária. Associava-se disartrofonia com voz astênica, disfagia para líquidos, retenção urinária, constipação e disfunção sexual.
Ao exame físico apresentava paralisia facial central direita, envolvimento do nervo glossofaríngeo e nervo vago direitos; tetraparesia espástica, pior no lado direito com grau de força 3 distalmente, hiperreflexia bilateral dos membros, clônus sustentado no tornozelo direito, reflexo de Trömner bilateral e sinais de Babinski.
Não havia ataxia cerebelar e ele conseguia andar sem apoio, mas com marcha em tesoura; houve preservação do equilíbrio estático e dinâmico; sensibilidade superficiais e profundas preservadas e sinal de Romberg negativo.
A ressonância magnética apresentava os achados abaixo:
Foram aventadas inicialmente a possibilidade de lesão de substrato desmielizante como NMOSD, assim como causas auto-imunes, granulomatosas e paraneoplásicas. Após investigação laboratorial e tomográfica negativas, e diante dos achados da RM sugeriu-se a possibilidade de Doença de Alexander, sendo posteriormente confirmada em painel genético.
DISCUSSÃO:
As leucodistrofias nos adultos são raras e de difícil diagnóstico diferencial com as doenças adquiridas da substância branca, como as de causas desmielinizantes e vasculares. Os achados de RM tem papel fundamental nessa diferenciação diagnóstica, uma vez que lesões confluentes e simétricas podem sugerir uma causa genética.
A impregnação das lesões pós-contraste normalmente sugere uma causa inflamatória. Dentre as leucodistrofias poucas apresentam impregnação pós-contraste como a adrenoleucodistria ligada ao X e leucoencefalopatia com calcificações e cistos (Labrune).
Neste grupo, o envolvimento proeminente do bulbo e da parte superior da medula espinhal deve levantar a suspeita de doença de Alexander, uma leucodistrofia autossômica dominante com mutações de novo ou hereditárias no gene da proteína ácida fibrilar glial (GFAP).
O chamado “sinal do girino” (medula oblonga e atrofia da medula espinhal cervical superior com volume preservado da ponte) sugere fortemente a doença de Alexander. Pode haver também alteração de sinal no mesencéfalo, nos pedúnculos cerebelares médios, nos núcleos da base e na substância branca periventricular, por vezes com o aspecto “garland like”, um achado peculiar inicialmente descrito pela van der Knaap (Neurology Feb 2006, 66 (4) 494-498; DOI: 10.1212/01.wnl.0000198770.80743.37).
A espectroscopia de protóns na doença de Alexander pode mostrar aumento do mio-inositol. Embora este não seja um achado sensível na forma de início na idade adulta, o aumento do mioinositol neste caso foi outra pista diagnóstica.
Fonte: Oliveira DA, et al. Pract Neurol 2023;0:1–4.