Vamos revisar os principais conceitos e diagnósticos diferenciais da persistência cística da bolsa de Blake?
1. Persistência cística da bolsa de Blake
– Malformação cística da linha média da fossa posterior.
– Fisiopatologia: ausência de fenestração da bolsa de Blake (BB), uma estrutura embrionária contínua ao IV ventrículo. Usualmente a BB comunica-se com o espaço subaracnoide em torno da 18º semana de gestação formando, assim, o forame de Magendie. Caso esta fenestração não ocorra, não haverá livre fluxo de líquor do interior do IV ventrículo para o espaço subaracnoide, instalando-se hidrocefalia tetraventricular.
– Quadro clínico: variável, desde casos assintomáticos, até ataxia/vertigem ou hipertensão intracraniana por hidrocefalia descompensada.
– Imagem:
– Formação cística infra-retrocerebelar/vermiana
– Hidrocefalia tetraventricular
– Intenso flow voidno aqueduto cerebral
– Sequências CISS 3D podem auxiliar na identificação das paredes do cisto
– Verme cerebelar comprimido e deslocado superiormente, e não hipoplásico.
– Atenção! Rotação vermiana tardia pode ser importante pitfall na avaliação pré-natal. O ideal é repetir o exame no início do terceiro trimestre para evitar fator confundidor.
– Tratamento: cirúrgico
– Inserção de cateter de drenagem liquórica
– Terceiroventriculostomia
– Fenestração do cisto: usualmente método insuficiente e com maior risco de complicações.
2. Cisto Aracnoide da Fossa Posterior
– Cistos aracnoides são lesões preenchidas por líquor e envoltas por membrana aracnoide, sem comunicação com os espaços subaracnoides intracranianos ou sistema ventricular.
– Na fossa posterior, é mais comum em posição retro-vermiana, mas pode ocorrer em qualquer posição.
– Imagem: lesão cística com isossinal ao líquor em todas as sequências. A depender do tamanho, pode promover efeito expansivo com compressão cerebelar e remodelamento da calvária adjacente. Verme cerebelar normoposicionado e com morfologia preservada.
– Não costuma associar-se à hidrocefalia obstrutiva.
3. Mega cisterna magna (MCM)
– De forma geral, constitui variante da normalidade.
– Cisterna magna alargada (> 10mm – sagital), com cerebelo e tronco cerebral normais.
– Comunicação livre com o IV ventrículo e espaço subaracnoide espinal, não há hidrocefalia associada.
4. Hipoplasia cerebelar e vermiana
– Primária (malformação) ou secundária (disrupção).
– A avaliação da morfologia cerebelar é confiável a partir de 19/20 semanas de gestação.
4.1. Primárias: associadas a desordens cromossômicas, metabólicas, síndromes genéticas.
– Síndrome PHACE:
– Anomalias da fossa posterior, hemangioma, anomalias arteriais, anomalias cardíacas e oculares.
– Achado específico: “tilted telephone receiver sign”
– Hemisfério cerebelar hipoplásico unilateral e deslocado para cima, com variados graus de hipoplasia vermiana
– 4º ventrículo dilatado de forma assimétrica e conectado a um cisto retrocerebelar ipsilateral
– Conexão oblíqua alongada entre os hemisférios cerebelares
– Síndrome de Joubert:
– Ciliopatia autossômica recessiva (exceto mutação OFD1, ligada ao X).
– Sinal clássico: “Sinal do dente molar“
– Pedúnculos cerebelares superiores alongados, espessados e horizontalizados
– Fossa interpeduncular profunda
– Cursa com graus variados de hipoplasia cerebelar e vermiana
– Malformação de Dandy Walker (MDW):
– Caracterizada por hipoplasia, elevação e rotação anti-horária do verme cerebelar, associada à dilatação cística da fossa posterior. A hipoplasia vermiana é mais acentuada em seu aspecto inferior. Inversão tórcula-lambdoide e hidrocefalia podem ser observadas, mas não são achados consistentes e, portanto, não faz parte dos critérios diagnósticos.
– Diversos genes têm sido associados à hipoplasia cerebelar e à MDW, sugerindo que estas entidades correspondam a extremos do mesmo espectro.
– A MDW pode ocorrer isoladamente ou parte de síndrome de herança Mendeliana, aneuploidias ou outras anomalias cromossômicas.
4.2. Secundárias: defeito congênito em tecido com potencial de desenvolvimento normal, desencadeado por fator extrínseco, como infecção perinatal, hemorragia ou isquemia. No caso de disrupção cerebelar/vermiana, a estrutura afetada apresentará anomalia congênita em tamanho e forma.
A matriz germinativa cerebelar é localizada em regiões altamente vascularizadas, nas margens do IV ventrículo e na camada granular externa. Fatores perinatais que conferem risco de hemorragia de matriz germinativa supratentorial, podem também desencadear hemorragia infratentorial.
Pra finalizar, vamos resumir tudo em uma tabela?!
Fonte:
Thomas Kau, Robert Marterer, Raimund Kottke, Robert Birnbacher, Janos Gellen, Eszter Nagy, Eugen Boltshauser. Clin Neuroradiol 2020.