Este é um caso publicado no site da Sociedade Americana de Neurorradiologia Pediátrica (ASPNR).
Trata-se de uma menina de 14 meses de idade, com hipertensão pulmonar, convulsões e pupilas dilatadas desde o nascimento.
Antes de mais nada, vamos às imagens do caso? Colocamos já com as legendas (pra facilitar pra vocês, hein! :D)
Estes achados, tanto clínicos quanto por imagem, são bastante sugestivos de arteriopatia cerebral associada às mutações Arg179His na ACTA2.
A arteriopatia cerebral associada às mutações da ACTA2 é um protótipo das arteriopatias cerebrais não ateroscleróticas. Mas o que é exatamente a ACTA2? ACTA2 (actina alfa 2) é uma proteína da actina com vários aliases, incluindo alfa-actina, alfa-actina-2, músculo liso aórtico, etc… Assim, a ACTA2 é um elemento essencial na contração de células musculares lisas vasculares.
O fenótipo das alterações vasculares inclui:
– Dilatação das artérias carótidas internas proximais
– Oclusão/estreitamento das carótidas internas distais
– Artérias do polígono de Willis “esticadas” e “semelhantes a vassouras”
– Ausência de colaterais, achado que auxilia na diferenciação do padrão Moyamoya
– Doença oclusiva das pequenas artérias, levando a episódios recorrentes de AVC e AIT. A doença oclusiva é resultado de fibrose, espessamento da parede vascular, desorganização e proliferação de células musculares lisas.
Dentre todos esses achados, o mais característico e “cara-crachá” é o das artérias retas e com padrão “esticado”. Se vocês se depararem com este sinal… é mandatória acender a luzinha e lembrar das mutações do ACTA2! 🙂
Além do clássico fenótipo vascular, em 2018 a AJNR publicou uma série de casos descrevendo alterações parenquimatosas relacionadas à arteriopatia relacionada ao ACTA2, sendo alguns descritos como patognomônicos. Quais são esses achados?
– Flexão e hipoplasia do corpo caloso anterior, principalmente com o rostro mal formado e achatamento do joelho.
– Corpo caloso em forma de V nas imagens axiais.
– Giros anormais nos lobos frontais e ausência do giro do cíngulo anteriormente.
– Ponte com aspecto em “Twin peaks”: ponte achatada com redução do diâmetro anteroposterior, destacando-se uma impressão da artéria basilar na superfície anterior da ponte, com consequente presença de 2 proeminências simétricas que se assemelham a “montanhas gêmeas“.
– Múltiplas indentações na superfície da ponte no plano sagital, por prováveis ramos arteriais pontinos endireitados.
– Grau variável de horizontalização e espessamento do fórnice, isto é, quase paralelo ao corpo caloso.
Interessante, não?!
Embora seja uma patologia rara, esses achados são extremamente úteis para nossa suspeição diagnóstica. Voltem nas imagens e tentem memorizar estes padrões. Eles lhe poderão ser úteis um dia. Afinal, a medicina é feita de padrões que se repetem!
Ao suspeitarmos deste diagnótico, o teste genético será direcionado, com chance de diagnóstico precoce e possível melhoria no prognóstico desses pacientes.
Sugestão de leitura:
Expanding the Distinctive Neuroimaging Phenotype of ACTA2 Mutations
American Journal of Neuroradiology November 2018, 39 (11) 2126-2131.